:: Cristianismo no Japão

No Japão do séc. XVI várias transformações poderiam comprometer seriamente a antiga estrutura disciplinar implantada pelos samurais. O causador de tudo isso foram os jesuítas.

O cristianismo no Japão não deu certo e colocado à margem da lê em 1612 pelo xogunato Tokugawa. O escritor católico Shusaku Endo, esclarece que “o Japão é um pântano porque absorve toda a sorte de ideologias, transformando-as em si mesmo, e distorcendo-as no processo de faze-lo”, e lamenta “se esse cristianismo fosse menos incorrigivelmente ocidental, as coisas poderiam ter sido diferentes”.

Mas Francisco Xavier achava do Japão, “o país do Oriente mais apropriado ao cristianismo” e criticava os chineses por não demonstrarem interesse algum do que lhes era ensinado. O interesse em catequizar os japoneses foi após o seu encontro casual com o samurai Anjirô em Malaca, na Malásia e admirou-o pela cultura. Ajirô contou a Xavier sobre o Japão. Cronologicamente, Ajirô foi o primeiro cristão japonês, batizado com o nome de Paulo de Santa Fé. Esse encontro aconteceu no mesmo período que teria encalhado nas costas de Satsuma (Kagoshima) – provavelmente no ano de 1542 – um junco de construção siamesa transportando três mercadores portugueses, entre eles Fernando Mendes Pinto a quem foi delegado a descoberta da rota para o Japão.

Quando Francisco Xavier chegou ao Japão, acompanhado de quatro cristãos japoneses encontrou um país arruinado pela Guerra dos Cem Anos, período este, conhecido por Sengoku. Os daimyos (Senhores Feudais) não se entendiam e inclusive, havia lutas entre os monastérios budistas. Lutas estas que iniciaram na metade do século X. as milícias eram formadas por leigos e sôhei – monges da categoria inferior. O governo não tolerava essas intrigas religiosas que consistiam numa ameaça. O cristianismo levado pelos jesuítas recebeu total apoio dos governantes, primeiro Nobunaga Oda e depois Hieyoshi Toyotomi. Houver conversões e construções de igrejas e de seminários.

A unificação do país era o sonho dos governantes e a amizade com os missionários era em parte motivada pelo desejo de comercializar com os navios de Macau sob o controle dos jesuítas. É bom ressaltar que tanto Nobunaga quanto Hideyoshi nutriam uma profunda antipatia ao budismo.

Numa carta de Francisco Xavier ao seu superior Inácio de Loyola, dizia que os missionários deveriam ter conhecimento de vários fenômenos do universo, pois os japoneses ansiavam saber sobre o movimento de corpos pesados, porque acontecia o eclipse solar, a chuva, a neve e os trovões. Esse contato com a cultura ocidental floresceu no Japão um rápido progresso científico totalmente absorvido pela classe dominante, a dos samurais. Os japoneses eram mestres na absorção e na sua imediata adaptação, como o desenvolvimento de uma indústria bélica: pistolas e espingardas.

O relacionamento íntimo entre os jesuítas e o governante Oda era tão cortês, que em 1582, o padre Valignano foi em missão à Roma levando consigo quatro meninos japoneses. Um fato curioso dessa viagem a passagem por Portugal: escravos japoneses pelas ruas de Lisboa. A escravidão japonesa foi proibida mais tarde pelo rei D. José I.

Início das perseguições

Os próprios historiadores não sabem concretamente porque em Julho de 1587, o generalíssimo Hideyoshi acossado de uma ira doentia determinou que os missionários não poderiam permanecer no país. Ele teria afirmado: “decidi”. Houve expulsões e destruição de igrejas, mas o decreto ficou só no papel. Os jesuítas contavam com um forte aliado: os damyos cristãos do sul. A comunidade cristã da época contava com duzentos mil convertidos, cujo número crescia assustadoramente. Hideyoshi desafiava a sua própria ordem e desfilava pelas salas douradas do Palácio de Juraku usando roupas portuguesas e um rosário. Porém a sua fúria foi maior, dez anos depois, não aceitando a provocação de um capitão espanhol que se gabava da grandeza do império espanhol e que devia em parte a ação dos missionários. Hideyoshi mandou executar na cruz 26 cristãos numa noite fria de 1597.

Nesses 70 anos de relacionamento com o cristianismo, o Japão modificou totalmente o sistema de se guerrear: antes era de homem para homem, agora, com a artilharia (lembram-se do filme Ran). Do ocidente, introduziu-se o vidro, o vinho, os óculos, o espelho, o relógio, a lã, a matemática, a geografia, a engenharia, a impressão gráfica, a metalurgia e o latim. O primeiro dicionário japonês/português foi compilado nessa época pelos jesuítas. Em suma, os governantes já estavam satisfeitos e preocupavam-se com o crescimento da influência cristã nos feudos. Boa parte dos príncipes do Sul tinham aderido a nova fé.

O japonólogo Georges Busquet esclarece que “a nova religião tornou-se o laço político dos feudais que lutavam contra o poder central que o Taiko-Sama (governante) e os sucessores se esforçavam por concentrar nas mãos”. Busquet afirma que “o nome cristão tornou-se sinônimo de rebelde... o cristianismo ameaçava criar um Estado dentro do Estado”. Além disso, os jesuítas portugueses se rivalizavam com os franciscanos espanhóis envolvendo questões políticas e pessoais.

A aristocracia cristã

O cristianismo foi acalentado por inúmeras famílias tradicionais. Uma delas foi a de Ukon Takayama, nobre e guerreiro ao serviço de Hideyoshi. Ukon construiu 20 igrejas e converteu 18 mil vassalos. Foi um dos sete discípulos do mestre Rikyu-Nanatetsu, da cerimônia-do-chá e igualmente um notável guerreiro. Quando Hideyoshi proibiu o cristianismo, pela segunda vez, ordenou que Ukon abandonasse sua fé. Ukon recusou. Hideyoshi enviou Rikyu para lhe dar mais uma chance, ao que ukon respondeu: “um verdadeiro samurai nunca muda suas decisões, mesmo que tenha que contrariar o seu Senhor”.

Expulso de suas terras, Ukon refugiou-se no sul do país e serviu ao daimyo Toshiie Maeda e novamente mostrou sua bravura numa batalha contra o clã Hojo, carregando consigo o seu brasão em forma de cruz. Indiretamente servia novamente ao seu antigo Senhor, o suserano Hideyoshi. Na batalha de Sekigahara os daimyos cristãos lutaram ao lado das forças de Hideyoshi, mas acabaram derrotados por Tokugawa.

Com Tokugawa no governo, o fim de Ukon e dos cristãos estava próximo. Ukon com 62 anos foi exilado para Luzon (atual Filipinas) onde faleceu, vítima de malária. Em vida, Ukon influenciou Tama Hosokawa a aderir a fé cristã, batizada com o nome de Gracia. Gracia Hosokawa era uma mulher inteligente e bela. A última resistência cristã aconteceu em Nagasaki, conhecida como a rebelião de Shimabara tendo à frente o samurai Shiro Amakusa.

Fim de um sonho

A inquisição foi instituída em 1640 pelo xogun Iemitsu Tokugawa quando se iniciou uma perseguição aos cristãos. Nos templos budistas cadastravam-se o nome e o endereço de todos os seus fiéis, como uma forma de controle sobre a população. Torturas físicas e psicológicas foram insufladas contra os cristãos. A coação psiclógica era a que mais doía. Os inquisidores criaram o fumiê, que consistia em obrigar os cristãos a calcarem o pé da imagem de Cristo ou da Virgem, apostatando-se de sua fé.

A maior vitória dos inquisidores foi o padre Ferreira apostatar-se e passando para o lado dos seus acólitos entregou os seus antigos companheiros. Três mil mártires foram feitos e outros apostataram-se. No auge do cristianismo no Japão, havia 700 mil adeptos, quase a população atual de japoneses e de seus descendentes no Brasil.

O cristianismo no Japão foi um sonho – ou um pesadelo – que os japoneses não dão muita importância.  Fica aqui a inquietação de Endo: “se o cristianismo não fosse tão ocidental...”.

Cronologia dos Cristãos Japoneses

1541    Francisco Xavier chega a Goa – Índia.

1542    Fernão Mendes Pinto desembarca no Japão
          acompanhados de dois mercadores. São os
          primeiros europeus a entrar no país.
1549    Francisco Xavier chega ao Japão.

1551    Xavier deixa o Japão.

1573    O general Nobunaga Oda depõe o xogunato Ashigaka e inicia a era Azuchi Momoyama.

1582    Mensageiros japoneses no Vaticano. Oda é traído   e moto, assume Hideyoshi Toyotomi.

1587    O cristianismo é proibido, mas fica só no papel.

1590    Volta dos mensageiros ao Vaticano e introdução                da imprensa gráfica.

1591    Publicação do “Heike-monogatari” e “doutrina                Cristã” em Amakuda.

1593    Os Franciscanos chegam ao Japão e iniciam atrito             com os jesuítas.

1596    Nova perseguição aos cristãos.

1597    Martírio dos 26 cristãos.

1598    Morte de Hideyoshi.

1600    Batalha de Sekigahara e derrota  dos aliados de               Hideyoshi.

1603    Ieyasu inicia o xogunato Tokugawa – a Era Edo.

1609    Início do comércio com a Holanda.

1612    Cristianismo é colocado fora de lei.

1613    Início do comércio com a Inglaterra.

1614    Expulsão de 148 cristãos para Manila e Macau, entre eles  se encontrava o fidalgo Ukon Takayama.

1615    Queda do Castelo de Osaka, o último reduto de                Hideyoshi.

1616    Morte de Ieyasu.

1623    Morte de Hidetaka e assume Iemitsu. Perseguição   e matança aos cristãos que não se converteram.

1638    Revolta de Chimabara e expulsão dos portugueses.

1639    Fechamento dos portos japoneses.

1640    Instituição oficial da Inquisição.

1664    O governo estimula a conversão e o cadastramento dos  convertidos nos templos budistas.

1792    Fim da Inquisição.

1873    Reconhecimento do cristianismo.

AO USAR INFORMAÇÕES DESTE SITE, NÃO DEIXE DE MENCIONAR A FONTE www.culturajaponesa.com.br

LEMBRE-SE: AS INFORMAÇÕES SÃO GRATUÍTAS, MAS ISTO NÃO LHE DÁ DIREITO DE SE APROPRIAR DELAS.

CITANDO A FONTE, VOCÊ ESTARÁ COLABORANDO PARA QUE MAIS E MELHORES INFORMAÇÕES SOBRE DIVERSOS ASSUNTOS SEJAM DISPONIBILIZADOS EM PORTUGUÊS.

 Voltar