Tetsuo Okamoto

 

Tetsuo Okamoto é um nome muito conhecido, principalmente por aqueles com mais de 60 anos de idade. Ele foi o primeiro brasileiro a trazer uma medalha olímpica de natação para o Brasil. A façanha aconteceu em Helsinque, na Finlândia, em 1952.

Nesta entrevista, Okamoto, hoje com 72 anos de idade, relembra aqueles fatos que marcaram a sua época e comenta o significado daquela conquista para o Brasil e para os japoneses aqui radicados.

Como começou a praticar natação?

Eu era asmático e comecei a nadar por que alguém disse que isso faria bem. Nós morávamos em Marília, na época uma cidade distante, de onde a simples ida a São Paulo levava até 12 horas de trem.

Um dia surgiu um ex-nadador, que pretendia formar uma equipe de natação em Marília. Eu tinha uns 15 anos e passei a treinar com esse grupo num bom clube, deixando de lado aquela piscina sem azulejos onde eu havia iniciado.

E como começou a competir?

Naquela época era muito difícil e caro viajar. E sabíamos que, se fôssemos competitivos, poderíamos viajar e conhecer vários lugares. Começamos treinando para ganhar viagens e fomos crescendo. Assim, participei do campeonato paulista e do brasileiro, além dos regionais.

Nadávamos de 1000 a 1500 metros por dia. O técnico tinha medo de forçar muito, pois éramos todos franzinos, tanto é que o meu apelido era Tachinha, porque tinha uma cabeça grande e o corpo magrinho.

O que aconteceu para um garoto franzino poder ir para uma Olimpíada?

Em 1949, quatro nadadores japoneses vieram ao Brasil. Eles ficam notáveis em sua época, pois passaram pelos Estados Unidos e derrotaram todos os americanos. Apelidados de “Flying Fish”, ou peixes voadores, aqueles japoneses ganharam até matéria na revista Time, e representavam o fato mais excepcional do esporte mundial. No Brasil ficaram dois meses fazendo exibição em várias cidades. Nós os atletas brasileiros acompanhamos o grupo “de reboque”, nos deliciando da calorosa recepção que eles tiveram.

Foi aí que os japoneses recomendaram que nós nadássemos 10 km por dia para treinar. Eu fui o único doido que decidiu treinar duro para ser campeão.

Quais foram os resultados?

Eu bati o recorde pan-americano, e nos Jogos Pan-Americanos de 1951 ganhei três medalhas: Ouro nos 400 e 1.500 m nado livre, e prata no revezamento 4×200. Na época não havia tantas categorias como hoje. As provas eram somente de 100, 400 e 1.500 metros. Foi um feito notável. No dia que voltei para Marília, a preeitura havia decretado feriado, montaram até palanque e fizeram uma grande recepção. Ganhei manchete nacional, numa época em que o esporte brasileiro estava em baixa, principalmente por causa da derrota do futebol na Copa do Mundo realizado no Brasil em 1950. Voltei como herói. O Brasil conquistou ao todo cinco medalhas de ouro e eu participei com duas.

Nas olimpíadas como foi o confronto com os ídolos japoneses?

Dos quatro que estiveram no Brasil, três disputaram comigo em Helsinque. Os treinamentos deram certo e eu ganhei a medalha de bronze nos 1.500 m, atrás do japonês Shiro Hashizume. Em primeiro lugar ficou outro descendente de japoneses, o americano Ford Konno. O pódio ocupado só por “japoneses” chamou muita atenção na época. Fui para o Japão em 77 e eles ainda se lembravam disso.

Voltei para Marília e houve festa de novo e mais um feriado. Naquele ano, o Brasil ganhou só mais duas medalhas olímpicas. Ademar Ferreira da Silva ganhou ouro no salto triplo e José Teles da Conceição teve bronze no salto em altura.

Qual foi a repercussão na comunidade nipo-brasileira?

O Japão tinha sido derrotado, muitos japoneses do Brasil tinham sido humilhados durante a guerra, e viviam na roça em condições difíceis. Acredito que o fato de ver alguém se destacando ajudou a motivá-los. O significado daquela medalha foi como se fosse uma conquista da coletividade.

O que aconteceu depois?

Mudamos para São Paulo no mesmo ano e meu pai parou de patrocinar. Daquele momento em diante deveria trabalhar e estudar se quisesse ter uma vida tranqüila pela frente. Na época, o esporte era puramente amador e nem podíamos ter qualquer remuneração ligada ao esporte. Trabalhando e estudando, não tinha tempo para treinar. Um atleta peruano que estudava nos Estados Unidos me deu a dica e consegui uma bolsa na Agricultural Mechanical College of Texas – uma escola militar americana. Sendo o principal atleta da equipe de natação, não sofri preconceito algum na universidade, mas os negros e latinos em geral não podiam estudar no mesmo campus dos brancos. Havia banheiros e bebedouros separados para os brancos e os negros na cidade.

A época era outra…

Sim, o mais engraçado é que naquela cidade que eu estava, os banheiros eram separados para brancos e negros. E eu entrava com os brancos. Mas quando fui para a Califórnia, os banheiros eram para brancos e “coloridos”. O “colorido” no caso incluía todos menos os brancos.

Vamos falar do Nippon

Realmente é um clube 100% organizado com diversas opções de lazer e convivência social. É um clube que deve ser preservado e apoiado. Acho que os clubes de outras etnias não chegaram a esse porte.

A natação do Nippon pode preparar competidores?

Uma estrutura para natação é cara, precisa haver subsídios para se manter uma equipe competitiva. Acho difícil um clube de lazer como o Nippon formar equipes para competir. Dá para manter o atleta até um certo estágio, mas depois eles terão que treinar fora, mais perto de sua casa, por causa da distância e o tempo que a locomoção toma do atleta. Outro problema é que as equipes mais competitivas acabarão levando os melhores atletas que despontarem no clube. Alguns, inclusive, poderão ser convidados pelos clubes do exterior.

Publicado na Revista Nippon nº29.