Hideaki Iijima

 

O “Cultura Japonesa” publica uma entrevista exclusiva com o empresário japonês Hideaki Iijima, proprietário da rede de salão de beleza Soho que tem 30 lojas, e que trouxe a dança jovem Yosakoi Soran ao Brasil, sendo seu principal incentivador até hoje.

Como o senhor se interessou em morar no Brasil?

Em 1974, com apenas 23 anos de idade, eu passei a trabalhar num famoso salão no bairro de Harajuku (conhecido pela moda jovem), em Tóquio. Era um grande progresso, pois no meu primeiro emprego de cabeleireiro ganhava a metade do valor do aluguel do quarto de 6 m² onde morava, tendo que entregar jornal de madrugada para completar a renda. Em Harajuku continuei progredindo, e em 79 já era o diretor geral do salão, dava aulas e tinha um salário 4 a 5 vezes maior do que um assalariado comum. Mas eu era muito jovem e queria tentar alguma coisa diferente, talvez mudar para o interior do Japão ou um outro país. Ser diretor daquele famoso salão era gratificante, tinha clientes no País todo, mas eu trabalhava muito, pouco convivia com minha família e só tirava 4 ou 5 dias por ano de férias. A gota d’água foi quando um dia, o meu filho de três anos me chamou de “tio”. E isso foi assustador.

Mas não tinha como conciliar família e trabalho?

Quando eu era criança na província de Saitama, o meu pai era barbeiro e só descansava na segunda-feira, e eu estava na escola. Então não convivia com ele, e eu havia prometido a mim mesmo que seria um assalariado comum para ter tempo livre para a família. Só que resolvi fazer um curso de dois anos para ser cabeleireiro e logo em seguida estava trabalhando em Tóquio, num ritmo cada vez mais intenso.

Como surgiu a opção do Brasil?

Eu não pensava em ficar para sempre no exterior, calculei que poderia trabalhar por três anos e voltar, sem atrapalhar os estudos de meu filho. Um dos meus ex-alunos tinha um salão em São Paulo e assim, acabei vindo para conhecer o Brasil. Fiquei dois anos no salão dele e mais um no salão Jacques Janine. Depois de três anos, era hora de fazer as malas. Só que a minha esposa e os filhos já tinham se acostumado e disseram que queriam permanecer no Brasil. Aí surgiu a vontade de abrir meu próprio negócio aqui.

Qual foi o primeiro salão?

O primeiro salão recebeu o nome de Camarim e foi inaugurado na esquina das alamedas Campinas e Santos. A sua inauguração se deu no meu 32º aniversário, em 15/9/82, por recomendação de uma amiga vidente, que previu que minha vida iria mudar a partir desse dia.

A vidente estava certa?

Não que eu acredite muito, mas o fato é que os negócios começaram a dar certo, e eu estabeleci como meta inaugurar uma filial a cada dois anos, sempre no meu aniversário. Era uma forma de cobrar os resultados de mim mesmo. Consegui manter as metas no começo, mas em 1987 os clientes estavam aumentando muito, e para poder atender todos, tivemos que passar a inaugurar uma loja a cada 1 ano e meio. Obviamente, a partir daí algumas lojas não foram inauguradas no aniversário.

Como começaram seus trabalhos sociais?

Eu sempre tive um pensamento de gratidão a todos aqueles que me ajudam, e então resolvi retribuir de alguma forma. Em 1989 criamos a Taça Soho de Corte de Cabelo, oferecendo bons prêmios, para agradecer aos mais de cem colaboradores que tínhamos naquelas primeiras cinco lojas. Só que desde o início, a Taça Soho foi aberta a todos os cabeleireiros que queriam participar, independente do salão em que trabalhavam. É uma forma de melhorar o nível geral e reconhecer o mérito desses profissionais. Nessa área realizamos também o Soho Creator, onde apresentamos as tendências de corte, coloração e estilos. Na área social, realizamos campanhas de corte de cabelo em diversos locais públicos, onde o cliente paga um preço simbólico que depois é doado para alguma instituição beneficente. As despesas ficam para a Soho e os profissionais trabalham como voluntários.

E a Zeladoria do Planeta?

Em 1995 a região de Kobe sofreu um grande terremoto, um dos maiores que se tem notícia no Japão. Um amigo me convidou para ajudar na assistência às vítimas, e quando estava lá participando, conheci o sr. Kagiyama, presidente da Zeladoria do Planeta. Essa entidade coordena a limpeza de locais públicos por voluntários, como uma forma de todos cuidarem e terem responsabilidade pela qualidade de vida de sua cidade. Ele me convenceu que a limpeza da rua melhorou muito a sua empresa e a sua cidade. Eu senti que era uma oportunidade para agradecer à cidade que me acolheu tão bem, e pedi para que o trabalho da Zeladoria fosse feito em São Paulo também.

O primeiro movimento da Zeladoria em São Paulo aconteceu em 1996. Em 2005, no 10º aniversário da Zeladoria do Brasil, fizemos um evento mundial aqui, reunindo 4 mil pessoas. Limpamos os bairros da Liberdade, Sé, Paulista e também escolas.

E o Yosakoi Soran?

Eu vi que os jovens descendentes de japoneses estavam se afastando da cultura japonesa, e não me refiro apenas às artes e à cultura em si, mas aos princípios da educação japonesa. Valores como o respeito ao horário e o respeito ao próximo, os quais estão presentes na prática do Yosakoi Soran. E eu achava que precisava fazer alguma coisa para o bem da comunidade nipo-brasileira. Assim, o Yosakoi Soran, que é um estilo de dança nova e vigorosa, poderia ser bem recebido pelos jovens brasileiros.

Lembro que o primeiro Festival Yosakoi Soran foi na rua, na Liberdade. Por que atualmente é realizado num palco?

O primeiro Festival foi na Rua Galvão Bueno e deu tudo certo exceto pelos comerciantes daquela rua. Eles reclamaram bastante porque a rua é muito estreita, e com a aglomeração ninguém podia passar muito menos entrar nas lojas… O segundo foi no Parque Ibirapuera, mas o terceiro, que seria no mesmo lugar teve que ser transferido na última hora por causa das obras. E aí fomos para a Via Funchal e estamos lá até hoje.

Quantos praticantes de Yosakoi Soran existem no Brasil?

É difícil precisar, mas acredito que existam 40 grupos. Nem todos participam do Festival porque os praticantes são estudantes em sua maioria e sei que é difícil viajar na véspera de uma prova, e para outros, a viagem seria muito longa e onerosa. O ideal seria que pudéssemos arranjar hospedagem para todos, mas onde iríamos colocar mais de mil participantes?

O patrocínio do Festival continua sendo da Soho?

Temos outros patrocinadores, mas a fatia maior tem ficado para a Soho.

Quem pratica o Yosakoi Soran?

Temos grupos de todas as idades, mas a maioria é jovem. O grupo da cidade paranaense de Castro tem participado todos os anos e é curioso que não tem nenhum oriental. Ele é patrocinado pela prefeitura local.

Soube que o senhor varre a Avenida Paulista todos os dias…

Entre 4h30 às 6 da manhã, de segunda a sexta e até sábado, estou varrendo este quarteirão da Avenida Brigadeiro Luis Antonio, Rua Manoel da Nóbrega, Alameda Santos e Avenida Paulista. Aqui na Brigadeiro eu enchia quatro sacos de 100 litros por dia. Agora, fazendo um percurso maior, pois um amigo me ajuda, recolho apenas dois sacos. Eu reparei que algumas pessoas também começaram a limpar e outros estão evitando sujar, o que é muito bom. Antes eu estava limpando o parque da Aclimação, mas outras pessoas começaram a limpar também, e aí não tinha mais nada para fazer.

Como está o trabalho da Zeladoria do Planeta?

Ela tem uma limpeza oficial por mês, nos seguintes locais: Aclimação na segunda quarta-feira do mês, Liberdade na primeira quinta-feira, Berrini na terceira quinta-feira, e a Praça Silvio Romero no último domingo do mês. Quem quiser pode participar. É um trabalho comunitário simples, mas muito interessante.

O que acha do Brasil?

Como todos dizem, o Brasil tem tudo, clima perfeito, mão-de-obra e matéria-prima. Eu acredito muito no Brasil e que ele vai se destacar no grupo do BRICs (Brasil, Rússia, China e Índia). Por ser japonês e ter vivido num lugar bem diferente, consigo ver as coisas boas do Brasil e também as ruins. Eu gostaria que todos compreendessem o sentido da palavra “mottainai”, que é um termo intraduzível, mas que é uma palavra que lamenta o desperdício. Temos energia, mas podemos economizar. Temos água, mas devemos economizar. Enfim, evitar o desperdício de materiais, de tempo e de qualquer coisa.

Finalizando, o que significa o nome Soho?

Eu me inspirei no bairro nova-iorquino, conhecido por seus intelectuais e vida boêmia. E também porque Soho em japonês significa “pássaro azul”. Existe uma lenda que conta que uma pessoa buscou a vida toda o pássaro azul sem nunca ter encontrado. Então, ele descobre que o pássaro azul era a felicidade, e ela esteve sempre no seu coração.

Para conhecer mais sobre o Soho