maio 132014
 

Pai de Lyoto Machida, lutador meio-pesado da UFC, Yoshizo é um dos mais respeitados professores de caratê do Brasil. 8º Dan de caratê Shotokan, 7º Dan de JKA e 3º Dan de Aikidô, ele tem a aparência de um verdadeiro samurai e educou seus filhos como guerreiros, mas conta nesta entrevista exclusiva que quando jovem gostava de brigar.

yoshizo machidaFoi a vontade de brigar que o trouxe ao Brasil. Ou melhor, foi a fama de briguento que o afastou do Japão. Quando estava prestes a terminar a faculdade de engenharia elétrica, Yoshizo foi o primeiro a levantar a mão quando um professor perguntou à classe, se tinha alguém que queria trabalhar na América do Sul.

No Japão, os estudantes do último ano distribuem seus currículos e comparecem às entrevistas de emprego, para serem contratados para o próximo ano fiscal. Yoshizo fez o que os outros fizeram, mas nenhuma empresa quis contratá-lo. Em parte, porque suas notas não eram boas, mas em grande parte porque sua fama não era boa. Tendo vencido um campeonato de caratê em Okinawa, berço dessa modalidade, ele era conhecido por gostar de brigar, no sentido físico da palavra.

“Sempre gostei de desafios e eu queria testar minha força em alguma coisa”, justificou o carateca sobre a sua decisão de deixar o seu País. Nascido na província de Ibaraki em janeiro de 1946, Yoshizo Machida praticou kendô, a esgrima japonesa, dos 6 aos 15 anos de idade. Mas não se identificava com o “esporte dos samurais”, porque gostava mesmo é de brigar. Resolveu começar o caratê para ser mais forte na briga, numa época em que essa modalidade não era bem vista e não era muito praticada, tanto é que Yoshizo foi o primeiro em sua cidade a praticar o caratê. Terminando o segundo grau em Tóquio, pensou em parar os estudos para trabalhar. Mas o gosto pelo caratê falou mais alto e resolveu fazer a faculdade para poder praticar o caratê por mais quatro anos. Treinava quatro horas por dia, não parava nem nos finais de semana, quando visitava outras academias para aprender mais. “Era um louco pelo caratê, meus pais incentivavam e eu treinava sem parar, e até tinha perdido a vontade de brigar”, lembra Yoshizo, que afirma ter estudado o mínimo possível, só para não se reprovar.

Quando avisou que viria para o Brasil, seus pais foram contra, não entendiam como um jovem que terminou a faculdade queria deixar o País. Mas, no final, eles concordaram: “Se é isso mesmo que você quer, que vá, mas é para ir com determinação de vencer”, disseram. O ano era 1968.

Yoshizo veio contratado como funcionário da Jamic, empresa de colonização do governo japonês, e foi parar no meio da mata amazônica, num lugarejo a 100 km de Tomé-Açu, no Pará. O trabalho era duro, pois seu serviço era construir estradas junto com os trabalhadores braçais. Mas isso não era problema e nem o fato de não ter energia elétrica. O problema é que não tinha onde praticar seu esporte predileto. Agüentou um ano e depois pediu demissão, levando bronca de seus superiores. “Eu estava determinado a vencer, mas eu queria vencer lutando caratê”, conta. Foi morar em Belém, capital do Pará, onde abriu uma academia de caratê.

Sem alunos e sem dinheiro, chegou a viver alguns meses só com água e farinha. “Eu limpava a academia, que era também a minha casa, lavava o banheiro e arrumava o tatame, para ficar esperando algum eventual interessado”. Embora acreditasse que um dia daria certo, não agüentou mais e resolveu ir para a Praça da Sé, em São Paulo, onde Keisuke Inoki (irmão do Antonio Inoki, ex-lutador profissional e senador do Japão), tinha uma academia de caratê. Morando no local, ajudava Keisuke como instrutor, mas, por ser estrangeiro, não podia competir. A sua sorte começou a mudar, quando, em 1970, um campeonato foi realizado em Brasília, onde se permitiu a participação de estrangeiros. Yoshizo venceu na categoria katá e kumitê, e ganhou admiradores imediatamente. Vieram vários convites e ele aceitou ir para Salvador, para trabalhar numa academia de caratê. Durante os 10 anos que ele permaneceu na capital baiana, viajou por todo o Nordeste ensinando caratê, e a sua academia se tornou a maior do Brasil, com mais de mil alunos. Naquele período, ele foi técnico da seleção brasileira nos Jogos Pan-Americanos e se casou com a baiana Ana Cláudia, com quem teve seus quatro filhos.

“Que educação daria a meus filhos? O de um samurai” pensou. E como não tinha nenhum parente com quem pudesse trocar idéias, resolveu encomendar um livro do Japão, que tinha o título de “Seiko no Tetsugaku” (A Filosofia do Sucesso, de Myouhou Fujii). Esse livro explica como os samurais educavam seus filhos, e Yoshizo seguiu cada linha daqueles ensinamentos. Em primeiro lugar, o samurai não pode mentir em hipótese alguma. “Nunca menti para eles, e nem mesmo cheguei a dizer que se não fossem dormir, um diabo viria buscá-los”, conta.

A educação rigorosa de samurai durou até cada um completar 10 anos de idade. “Para o samurai, a responsabilidade de educar seu filho vai até essa idade. Depois, a criança fica esperta, conversa com amigos e passa a ter sua própria identidade”. Os três filhos nascidos na Bahia e o caçula nascido no Pará praticaram caratê na infância.

Yoshizo conta que pretendia continuar morando na Bahia, quando um ex-aluno de sua extinta academia de Belém procurou-o pedindo para voltar para Pará e reabrir sua academia. O carateca brincou dizendo que só voltaria se ganhasse uma fazenda. Esse ex-aluno havia feito uma bela carreira, e para sua surpresa, arrumou uma fazenda para a família Machida. “A propriedade tinha 75 hectares, era muito grande, e não podia recusá-la, pois um dos meus sonhos quando estava deixando o Japão era ter uma fazenda no Brasil”. Morando no Pará, tentou administrar a academia e a fazenda ao mesmo tempo. Pegou todo o dinheiro que havia ganhado na Bahia e plantou cacau e mamão, e chegou a ter 15 funcionários. Entretanto, a fazenda não deu certo e ele canalizou sua atenção na academia.

No Pará, seus filhos cresciam. Lyoto, o terceiro filho, foi campeão pan-americano de caratê em 2001, bicampeão brasileiro de sumô, ganhou faixa preta de jiu-jitsu e se formou em educação física. Foi para o Japão e treinou durante três anos na academia de Antonio Inoki, além de ter praticado muay thai na Tailândia. Com esse vasto currículo e físico (1,88 m e 95kg), Lyoto começou a competir no MMA, no Japão.

Yoshizo Machida afirma que foi contra a decisão de Lyoto disputar MMA. “Havia poucas regras naquele esporte, por isso era muito violento e o juiz não interferia na partida”, lembra. “Depois, com o tempo, as regras foram criadas e se tornou um esporte de verdade”. Lyoto Machida, foi campeão dos meio-pesados da UFC em 2009, cujo título perdeu no ano seguinte. Hoje, após vitória contra o armêmio-holandês Gergard Mousasi em fevereiro, disputa novamente o título contra o atual campeão Chris Weidman, no dia 24 de julho de 2014 (UFC 175). Lyoto reside nos Estados Unidos, onde vive com a esposa e seus dois filhos.

yoshizomachida net divulgacaoyoshizo e familia machidacomTirando o caçula que é jornalista e trabalha na TV Globo de Brasília, os demais continuaram treinando e competindo, sendo que os dois mais velhos dirigem sua academia, agora com dois prédios de três andares e mais de 1.500 alunos.

Machida recorda que sempre ensinou a seus filhos que se deve fazer tudo da maneira correta, e que, com a dedicação, tudo vai acabar dando certo. “Eu sempre falo que é para treinar para melhorar e não para ganhar medalhas”.

Uma frase em japonês, cunhada por um nobre samurai no século XVIII, é o que sempre norteou esse imigrante japonês naturalizado brasileiro, e é essa frase que define a essência de Yoshizo Machida:

為せば成る、為さねば成らぬ何事も

Naseba naru, nasaneba naranu nanigotomo.

Frase que diz: “Tudo pode ser realizado se desejarmos profundamente, mesmo aquilo que é considerado impossível”.

Entrevista concedida para o jornalista Francisco Noriyuki Sato

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  One Response to “A incrível vida de Yoshizo, pai do Lyoto Machida da UFC”

  1. Criando conexões estratégicas, a ONG JOVENS CONEXÕES SOCIAIS é uma instituição não governamental sem fins lucrativos, cuja principal missão é promover qualidade de vida e cidadania, por meio de ações sociais, culturais e esportivas. Levando a muitas família educação de qualidade, oportunidades de emprego e qualidade de vida em geral.
    O motivo do nosso contato é para pedir os sacos, luvas e tatames que vocês não usam mais e possam nos doar para o nosso projeto que implantaremos com os jovens que desejam ser como o campeão Lyoto Machida.
    muito obrigado por
    http://www.jovensconexoessociais.org
    ongjovensconexoessociais@hotmail.com
    geraldosergioraymundo@hotmail.com

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